É ponto, é pedra… é o fim do caminho?

Foto: Martina Rathgens
É ponto, é pedra... Foto - MartinaRathgens
Outro dia alguém me falou de um livro que me chamou atenção.
300 páginas.
Uma frase em cada página.
E só.
Tudo o mais em branco.
Pensei.
Deve ser um livro fácil de escrever.
E de ler também.
Isso me fez pensar.
Muitas pessoas baseiam a vida em frases prontas.
Colocam ponto final em tudo.
São conceitos fechados.
Curtos.
Conclusivos.
Essas pessoas castram possibilidades que fujam do que aprenderam como certo.
Não abrem espaço ao novo.
Ficam presas a conceitos que a família ou a vida ensinou.
Não ousam.
Perdem oportunidades.
O diferente assusta.
Qualquer coisa que ameace sair do aparente controle é motivo de fuga.
E a vida vai ficando cheia de pontos finais.
Todo mundo sabe para que serve um ponto final.
Não é mistério para ninguém.
O próprio nome já revela a sua missão.
É pôr fim.
Encerrar questão.
Não há discussão.
A vida é assim e acabou.
Pronto.
Fechou.
Deu.
Já era.
Parece ser mais fácil viver assim.
Mas deve dar trabalho encarnar conceitos pré-fabricados todo santo dia.
Minha vida não é feita só de pontos finais.
Prefiro assim.
Preciso arejar o pensamento com vírgulas. Sim, a vírgula é pausa para respirar, deixar entrar ar novo, expelir o ar velho, viciado.
De vez em quando, permito-me parar na “esquina” do ponto e vírgula e respirar um pouco mais. E, com mais calma, elencar os itens que compõem minha história; os fatos que me construíram; os traços da minha personalidade; as quedas que me ensinaram; as vitórias que me fortaleceram.
Minha vida precisa de interrogações. Preciso abri-me às possibilidades que ainda não conheço. Questionar velhos hábitos, repensar, redescobrir-me. Preciso nunca deixar de aprender. E qual a outra forma de aprender, se não perguntando? A interrogação abre espaço para que outras pessoas participem da minha história, contribuam com minha busca.
Por que não? É isso mesmo? O que você acha? Como as pessoas me vêem? Como eu as percebo?
Depois de muitas perguntas, de tempos em tempos, dois pontos me ajudam a explicar, sobretudo para mim mesmo, o que sou: um ser em construção. E então me reafirmo.
Diante de tantas descobertas, uso e abuso das exclamações. Caraca! É isso! Eureca! Encontrei uma pista! Descobri-me!
Contudo, muitas vezes, o trabalho de escrever minha história para nas reticências… E um silêncio angustiante me invade. De repente, acho que tudo o que havia descoberto não passa de… Bobagem? Será? E se… Não, acho que não… Talvez eu…
Como que numa luta por sobrevivência, desespero-me. Quero me agarrar, como que a uma tábua de salvação, em meus conceitos de outrora. Porém, já não sou o mesmo.  Prostrado por terra, tento, como que num último suspiro de vida, pontuar novamente minha existência, tocar em algo palpável.
Formulo novos conceitos.
Preciso de chão para pisar.
E tudo fica sólido.
É pedra.
Firmo os pés.
Levanto.
Volto a andar.
Ganho confiança.
Mais rápido.
Corro.
Distraio-me.
Entro no automático.
Até que tropeço numa vírgula.
Pequena, quase imperceptível, ela me lança ao ar. Por um instante, penso poder voar. Atinjo o ápice. Depois, em queda livre, mergulho num mar de vírgulas; ponto e vírgulas; dois pontos; interrogações; reticências…
Retomo o caminho… Estou novamente tentando entender que tipo de texto sou.

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